Algo de novo


Existe algo de novo no ar
Não posso dizer que nunca vi
Pois já me é familiar
Mas digo que aqui

Dentro do peito de quem voz fala
Vive e nunca se cala
Pena, mas não se abala
E renasce a cada amanhecer.

E eu vejo nas nuvens, no tempo, nas flores
Eu vejo no céu desenhado de cores
As horas que passam e se passam por segundos
O mundo me abraça e eu abraço o mundo.

Ora, existe algo de novo no ar
Mas nem é tão novo assim
Pois está aqui dentro e vai sempre estar
Enquanto você estiver junto de mim.

A vaidosa

E assim, sem mais nem menos
Se fez palavra e rima
Quase em tons obscenos
Me pede que eu lhe suprima

A vontade de ser lida
De nascer de novo
De voltar a tomar vida
Nas palavras dos outros

Eu me esquivo
Não quero lhe ser escravo
Nem serei muito produtivo
A essa hora, no meu quarto

Mas não adianta, eu sei
Enquanto não for do seu jeito
E não tirar você do peito
Ficarei nessa angústia que eu criei

E assim, atormentado
Eu cedo aos seus pedidos de liberdade
Até o dia que você vai querer

Repetir o combinado
E num ato de vaidade
Se lançará para quem quiser ver.

Tenha piedade, tenha clemência.
Estou cansado dessa violência
Implique com outro. Se lance ao vento.
Me deixe em paz, só por um momento.



A Madrugada

Madrugada, o que te aguarda?
Seriam as rosas resguardadas?
Seriam as vidas depenadas?
Qual é o som do teu suspiro?
Por que vives tão calada?

Os postes de luz, "spots" de luz
Iluminam um palco sem vida
Sem roteiro, direção
Sem chegada ou saída

Coadjuvantes do espetáculo
Que ninguém pagou pra ver
Às vezes eu, às vezes você

Não há mocinho, nem princesa
Modos ou delicadeza
Não há espaço pra mais ninguém
Pois nesse vaivém da noitada
A única a dar risada
Será sempre a madrugada

Luz

Tantas as viagens que já fiz
Tantos os caminhos que percorri
Por tantas vezes me perdi e me achei.

Sou fruto do que vivi.
Sou fruto do que criei.
Mas me perguntas quem eu sou?

Metamorfose que anda, que canta, que vibra.
Que ama sem pensar no que haveria de ser.
Pois sou.
E sendo, me faço eu.

Eu mesmo, em carne, osso e luz.
Pois há de haver luz pra iluminar.
Por onde meu corpo passa. Me guia e conduz.
Não só a mim, mas a quem se aproximar.

Pois até mesmo a maior das estrelas no luar
Com todo seu brilho que à noite irradia
Se guardasse pra si o seu cintilar
Sumiríamos nós e ela também sumiria.

Além do Tempo


Peço desculpas por te amar assim.
Às vezes sem medidas, às vezes sem caução.
Todas as palavras que passam por mim
Não sabem como lhe fazer menção.

Mas eu tento.
Mesmo que pra isso eu brigue com o tempo.
Afinal, o que o tempo representa pra nós?

Com o tempo, as folhas se soltam dos galhos.
E os galhos, por vezes, se quebram no vento.
O vento que corre o mundo afora
Também se assenta e descansa um momento.

Coitado do tempo. O que ele não sabe
É que, conosco, ele nada pode
Pois como um farol numa tempestade
Que na sua missão ele lá se mantém
E ganha mais força com a dificuldade
Assim é o meu amor também.

Mas mesmo que o tempo faça seu feitiço
E, no fim de tudo, restarmos os dois
Estarei impávido junto ao compromisso
De amar-te até o fim.
E depois, e depois.

Soneto do Bom Agouro


A quem se interessar possa
Falo sobre o que incomoda
Tanta maldade que se apossa

Que parece virar moda
Cada um pensando em si
Que se mude, quem se incomoda.

Vou ser um nômade sem coagir
Com o que me perturba no mundo
Louco e só no meio de um frenesi

Serei o mais novo vagabundo
Que quer que o bem se espalhe à todos
Nem que seja por um segundo.

Mas vou levar comigo, sim
Meus pensamentos e ideais
E os declamando até o fim
Consoantes e vogais

Espero que alguém escute
Ouça, pense, quem sabe, curta.
Pois o que é puro repercute
E um dia muda nossa conduta.

As palavras


Malditas palavras.
Tão traiçoeiras e singelas.
Às vezes se escondem de mim.
Às vezes me escondo atrás delas.

Se arrumam como querem só pra brincar com os sentidos.
Fala e audição sofrem mais.
Bullying verbal.
Sofro por não conhecê-las como gostaria.
Como deveria.

Dever, de quem, só de ver,
deveria divertir-se com essa dádiva da vida.

Ah, malditas palavras.
Segregadoras da sociedade.
Ai de quem não reverenciá-las.
Sentirão na pele por toda a eternidade.

Malditas palavras.
Tão lúdicas e traiçoeiras.
Embalando uma criança até adormecer.
Estremecendo a quem lhe bem entender.

E, como uma paixão não correspondida, elas te esnobam.
Não estão nem aí.
E porque estariam?
Sabem que as precisamos.

Tão importantes como o ar.
Ou como a comida que nos alimenta.
Sem ela o amor não se sustenta
Nem há com o que se comunicar.

Pois os gestos sem a fala
Alguma hora se entrava
E cabe a nós abrirmos alas
Para elas, as malditas palavras.

Todo mundo

Não me conformo.
Todo mundo diz procurá-la.
Mas me diga, você já achou?
Foi debaixo de uma roupa cara?
Foi na pele de alguma paixão?

Foi na vitória de algum interesse?
Ou nutrindo alguma ilusão?
Sem perceber, se despediu como se não lhe fosse digna.
E voltamos para onde começamos.
Pois bem, não me conformo.

Onde está a tal da felicidade?

Como em um carrossel, volto ao mesmo lugar.
Procurando-a sem saber onde.
Quando a encontramos, lhe escapa pelos dedos.
Quando a vemos, logo some.
Quando a temos, é em sonho.

Percebo que a procuro no lugar errado.
Lá fora, ela é selvagem.
Viverá sempre à nossa margem.
Mas aqui dentro ela não foge.
E com atenção, estará sempre ao seu lado.

O meio

Faço me de bobo pra não entrar em picuinhas.
Digo que não escuto o que me ofenderia.
Fecho os olhos pra maldade ao meu redor.
Não acho que deva ser guiado por fatores externos.

Mas será que devo?

É o homem que faz o meio ou o meio que faz o homem?
Se o homem o meio fizesse, seria o homem parte de algum?
Ou estaria ele renunciando um meio em prol do seu próprio?

Meio que sem querer, este homem se vê solitário.
Não sabe bem como viver em meio às pessoas.
Mas se todos fossem como ele, teríamos, então, um outro meio.

O homem fazedor do meio, faria do meio fazedor de outros homens.
Acho que no meio do caminho eu me perdi.
Devo, ou não, me deixar influenciar pelo meio?

Tu

Do alto do meu deslumbramento te vejo.
Impávida, serena, intocável.
Olhos numa quietude de quem acredita que a vida lhe deve algo extraordinário.
Tens na pele marcas invisíveis a olho nu.
Mas é pele que exala o cheiro das flores que nem existem mais.
Se foram com os poetas, suas musas e inspirações divinas.
Se foram com a bondade e o amor verdadeiro.
Se foram com o poder de um sorriso sincero.
Se foram, mas ficaste tu.
Tu que tens no sorriso uma janela, não só pra tua alma, como também pra minha.
Basta sorrir pra me deixar feliz.
És dona de uma voz que, qualquer palavra que pronuncies,
Ecoa por horas em minha mente.
Danças, não porque gosta, mas porque teu corpo pede.
É a forma mais natural que consegues lhe imprimir algum movimento.
E ainda desafias a ciência, já que mantendo os dois pés no chão,
Consegues, vez ou outra, beliscar as nuvens.
Mas a ciência pertence aos homens.
E os homens se rendem a ti.
E assim como eles, me rendo também.

Da pracinha

Final de tarde, que harmonia!
Quinze horas mais ou menos
Cantam pássaros em sincronia
e a brisa criando esse clima ameno

O corpo mole nessa candura
Tanto bate até cansar
É nessa hora que a noite escura
Pede licença pra passar

E da janela, a criançada
faz valer sua inocência
Como se suas risadas
Fossem gritos por clemência:

"Fique aqui só um pouquinho,
não se faça como o vento
Que mal chegou, já foi-se embora.
Fique aqui comigo, Tempo."